Plínio Marcos e nossas Quebradas do Mundaréu — Parte-01
“Eu conto história das quebradas do mundaréu, lá de onde o vento encosta o lixo e as pragas botam os ovos”
Plínio Marcos — Em prosa e Samba nas Quebradas do Mundaréu. Noite fria em São Paulo, em uma madrugada qualquer, eu me peguei preso entre os diversos conteúdos e fotos de Plínio Marcos de Barros ou apenas Plínio Marcos.
Eu me senti perdido em uma história tão rica e itinerante, um conteúdo tão vasto que eu divide em duas partes mas poderia ser divida em dez, vinte e mesmo assim não falaria ⅓ de quem realmente foi o ator, escritor, diretor, jornalista e como ele mesmo definia, camelô.
Plínio nasceu em um berço humilde nas quebradas de Santos (SP), filho de um bancário (Armando) e de uma dona de casa (Hermínia), tinha 4 irmãos e uma irmã. Cresceu e evoluiu sua essência caiçara nas ruas da cidade. A Santos da década de 40 à 50, tinha seu charme e glamour, o jovem aspirante a artista transbordava seu talento por onde passava.
Seja jogando futebol ou atuando no dia a dia, ele queria impressionar, era a veia artística pulsando plena e mesmo com sua gagueira que se mostrava presente nos momentos de extremo nervosismo, o seu lado circense vinha lhe socorrer e a cidade viu desabrochar o “Palhaço Frajola”. O circo acaba por preencher a alma deste jovem torcedor do Jabaquara de esperança e o transporta para os palcos do Teatro Amador e lá através de sua exímia aptidão e por ser um homem de multi facetas, ele chama
atenção de Patrícia Rehder Galvão, mais conhecida como Pagu, uma jovem revolucionária que estava prestes a mudar a alta classe paulistana de ponta cabeça.
A amizade que nasceu através da peça no qual Plínio participou e que fora dirigida por Pagu chamada “Pluft, o Fantasminha”, ele chega às pressas para substituir um ator e acaba adentrando em um clube de intelectuais que o influencia. Esta relação mudou a vida de ambos e ainda mais para ele que dali em diante não parou mais de escrever e dirigir pequenas peças de teatro, enfim o mosquito da sétima arte o picou de vez.
Escrevendo textos que como ele mesmo definia era fora dos padrões da atual sociedade, como o clássico “Barrela”, a sua arte começa a ganhar destaque e logo São Paulo o recebe com toda sua inicial efervescência, e o acolhe naqueles temíveis primórdios da ditadura. Eram os anos 60, o jovem Plínio Marcos aporta na capital paulista e começa a perambular e conviver no centro, entre os mascates, sambistas, donas de casas e empregados, o botequim se torna refúgio para ali ele fazer o que se tornou a sua marca pessoal: se socializar.
Através de cada olhar e dentro do vai e vem desta evolutiva cidade ele devora cada detalhe das pessoas e as transpõem em seus textos alertando o mundo que existem outras pessoas na camada da sociedade que merecem atenção. (Seus trabalhos se tornam consagrados pela crítica e obras como: Dois perdidos numa noite suja, Navalha na Carne, Abajur Lilás ganham seu
espaço). Em cada página de seus livros e cadernos de peças de teatro uma realidade paralela era vendida em uma das profissões que ele mais se identificava: o camelô.
Seu jeito caricato e suas peças se tornaram convidativas, chamando a atenção de todos, inclusive das maiores damas do Teatro e do Cinema nacional: Cacilda Becker e Tônia Carrero. Estas duas mulheres enxergam no trabalho de Plínio, um novo momento
da classe teatral e também do cinema e ele ganha novas e boas amizades, capazes de apoiá-lo nos momentos mais complicados de sua carreira.
Mesmo quando fora perseguido pela censura, Plínio manteve seu posicionamento, disposto a quebrar paradigmas, a sua visão crítica começou a incomodar o governo.
“Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia”
Chico Buarque - Apesar de você
E claro que com toda sapiência e malandragem adquirida nos tempos em que transitava pelas ruas, ele mostrou que a melhor resposta para quem deseja cercear sua liberdade, era através da criatividade. E por transitar pelos caminhos do roçado do bom deus, o profano e sagrado samba o abençoou e através da amizade com nomes como: Geraldo Filme, Jangada, Silvio Modesto, Zezinho do Banjo, Zeca da Casa Verde, Toniquinho Batuqueiro e tantos outros…
O lado periférico começara a ganhar voz dentro da mídia paulistana.
Nelson Rodrigues pergunta: Plínio Marcos por que você se considera um dos maiores autores do Brasil?
Por que eu copio o seus defeitos, Nelson Rodrigues!
Em resposta ao Dramaturgo no Programa Abertura em 1979.